Palavras que hoje em dia quase não se usam mais - cordel

revista de cordel Palavras que hoje em dia quase não se usam mais


Janduhi Dantas
 
Que as musas do Cordel
tragam luz à minha mente
pra eu falar de algumas
palavras que no presente
velhinhas, cansadas, saem
da boca só raramente.
 
No meu tempo de menino
em Patos, no meu sertão
quando em andava descalço
jogando bola e pião
as palavras eram outras
na nossa conversação.
 
Tempo em que o país tinha
presidente general
candeeiro havia muito
pois blecaute era normal
minha mãe usava anágua
meu pai tinha uma rural.
 
Tempo em que nas brincadeiras
infantis pelo terreiro
gritava forte: “Sou prima!”
quem ia ser o primeiro
o segundo era o siga
e o derra o derradeiro.
 
Palavras daquele tempo
pra hoje achar se garimpa:
suco de hoje era ponche
maravilhoso: supimpa!
confusão era banzé
gente boa: barra limpa!
 
Pra gente naquele tempo
naquela época remota
lentidão era remancho
turma de amigos: patota
desperdiçar: estruir
vida mansa: maciota.
 
Se dava o nome chué
para coisas sem valor
alguém roendo, na fossa
estava a sofrer de amor
tamanho, altura era tope
xeleleu: bajulador.
 
Avarento: morta-fome
mulher feia era canhão
mulher bonita era uva
e homem bonito: pão
ganhando com grande folga
se ganhava de cambão.
 
Cair em golpe era o mesmo
que cair em arapuca
quando o caba era aluado
era então lelé da cuca
o elegante era lorde
irrisório, mixuruca.
 
Sem graça, fraco era xôxo
pra nós, tapa era bufete
perceber era dar fé
comprimido era cachete
fazer demora: embromar
infeliz era infitete.
 
Ficar de alguém à espreita
se dizia pastorar
encontrar-se com alguém
por acaso era topar:
“Eu hoje topei com João
lá na casa de Oscar”.
 
Não sendo a mulher mais virgem
se dizia “Foi bulida!”
se dizia atravessada
para a pessoa atrevida
do mesmo modo se tinha
pau-de-lata pra metida.
 
Com giz riscada a calça
pra brincar da onça, o jogo
ninguém conhecia ímã
a gente chamava azogo
falava à visita rápida:
“Você veio buscar fogo?”
 
Malino: menino inquieto
o dinheiro era tutu
muitas notas de dinheiro:
“Olha só o putufu!”
o amante: concubina
cabra besta: papangu.
 
Dizer-se “Vigie pra mim”:
mesmo que “Dá uma olhada”
a coisa estando no fim:
numa “peinha de nada”
ante uma grande surpresa:
Meu Deus! “Pela Madrugada!”
 
Estando alguém furioso
estava tão tiririca
adesivo era decalque
muito boato: futrica
fotografia: retrato
e carro velho: fubica.
 
“Sacudir o esqueleto”
era o mesmo que dançar
mafuá era bagunça
fazer sucesso, abafar:
“Zezinho tá abafando
com as moças do lugar”.
 
Sutiã era corpete
colega era pariceiro
lamentação: chorumela
matuto era beradeiro
avantajado: balofo
e mal pagador xeixeiro.
 
Alguém em dificuldade
se dizia: “Tá pebado!”
“Nem à força!”: “Nem a pulso!”
misturado era braiado
gente chata era cricri
e vermelho era encarnado.
 
Falar com um intrigado
era pedir penico
boato, intriga, conversa
disso o nome: mexerico
peteleco na orelha
se dizia bizurico.
 
Raio X: abreugrafia
cinto era corrião
quem chegava de repente
chegava de supetão
o mesmo que “Vá pra merda!”
era “Vá lamber sabão!”
 
Pra valer era na vera
carona era bigu
carro quebrado: no prego
ótimo era “Do peru!”
bronca grande era carão
dar dicas: passar bizu.
 
Tomar o tempo de alguém
era o mesmo que empalhar
motorista ruim: barbeiro
enfrentar era peitar
taxista: chofer de praça
não dar certo era gorar.
 
Conversar bobagem era
falar miolo de pote
prum bando de desordeiros
se dava o nome magote
quando o caba se zangava
se dizia: “Deu pinote!”.
Se estava na pindaíba
tava o caba no sufoco
proibir era empatar
estouro grande: papoco
armário era pitisqueiro
e algo no fim: cotoco.
 
Mocinha bonita: broto
marchante era açougueiro
camarinha era o quarto
preguiçoso era ronceiro
caneco: copo de flandre
bufunfa: muito dinheiro
 
Quem não comprava cigarro
vivia a pedir piola
nos cabarés da cidade
de ficha era a radiola
o cabra muito exibido
convencido era gabola.
 
“Fale logo!”: “Desembuche!”
mulher magra: lambisgoia
borocoxô: deprimido
coisa muito boa: joia!
discordar com veemência:
“Não senhor! Uma pinoia!”
 
Estar mordido do porco
era estar muito zangado
sem se saber onde estava
estava o cabra ariado
festa feita de surpresa
tinha o nome de assustado.
 
Palavra mofada, antiga
inda tem um escambal...
leitor, que esta minha lista
cê tenha achado legal
mas agora no cordel
vou botar ponto final.
 
E a você que é professor
peço um favor (cê me faz?!):
este cordel para a aula
leve e ponha num cartaz:
“Palavras que hoje em dia
Quase não se usam mais!”

Ivaldo Fernandes

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